Terapia gênica devolve imunidade a crianças com doença rara
- intergendivulgacao

- há 6 dias
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Um estudo internacional trouxe resultados marcantes para o tratamento da imunodeficiência combinada grave por deficiência de adenosina desaminase (ADA-SCID) — uma condição genética rara que compromete profundamente o sistema imunológico de recém-nascidos e pode ser fatal nos primeiros anos de vida.
O que é a ADA-SCID
A ADA-SCID é causada por mutações no gene ADA, responsável pela produção da enzima adenosina desaminase. Essa enzima é essencial para eliminar metabólitos tóxicos que se acumulam nas células do sistema imune.Sem ADA funcional, linfócitos T, B e NK são destruídos, levando à ausência quase completa de imunidade.
Crianças com ADA-SCID vivem em isolamento extremo e sofrem com infecções recorrentes e potencialmente fatais. Os tratamentos tradicionais incluem o transplante de medula óssea - limitado pela dificuldade em encontrar doadores compatíveis - ou a terapia de reposição enzimática, que precisa ser administrada continuamente e não corrige a causa genética da doença.
A estratégia de terapia gênica
O novo tratamento, desenvolvido por pesquisadores da University of California, Los Angeles (UCLA) e da University College London (UCL), busca corrigir o defeito genético diretamente nas células-tronco hematopoéticas (HSCs) dos próprios pacientes.
Essas células são coletadas e modificadas ex vivo com um vetor lentiviral derivado do HIV-1, desenhado para ser seguro e incapaz de se replicar. O vetor transporta uma cópia funcional do gene ADA, que é inserida de forma estável no genoma das células-tronco.
Após o procedimento, as células corrigidas são reintroduzidas no paciente - sem risco de rejeição - e passam a gerar novas células sanguíneas e imunes saudáveis, restabelecendo a defesa do organismo.
O estudo clínico
O trabalho, publicado no New England Journal of Medicine, acompanhou 62 crianças com ADA-SCID tratadas entre 2012 e 2019 em centros nos Estados Unidos e Reino Unido.Os resultados mostraram que 59 das 62 crianças (95%) alcançaram reconstituição imune duradoura, com 100% de sobrevida durante o período de acompanhamento médio de 7,5 anos.
Em até seis meses após o tratamento, os pacientes apresentaram níveis crescentes de células T funcionais e puderam interromper a terapia de reposição enzimática. Com a imunidade restaurada, as crianças passaram a levar uma vida normal - incluindo a possibilidade de receber vacinas e frequentar a escola com segurança.
Um dos avanços logísticos mais relevantes foi o uso bem-sucedido de células-tronco criopreservadas. Mais da metade dos pacientes recebeu células congeladas antes da modificação genética, com resultados comparáveis aos das células frescas - uma descoberta que pode facilitar a expansão global dessa abordagem.
Segurança e eficácia
Nenhum evento adverso grave relacionado à inserção gênica foi relatado - um marco importante em comparação com estudos mais antigos que utilizavam vetores retrovirais. Os dados indicam que a terapia gênica pode ser um tratamento único, com benefícios duradouros e baixo risco, eliminando a necessidade de intervenções contínuas.
“Esses resultados mostram que a terapia gênica pode oferecer uma solução duradoura e potencialmente curativa para doenças genéticas raras”, afirmou Donald Kohn, pesquisador da UCLA e autor sênior do estudo.
Impacto e perspectivas
A terapia gênica para ADA-SCID representa um exemplo emblemático do potencial transformador dessa tecnologia: corrigir o defeito genético na origem da doença e restabelecer o funcionamento normal do organismo. Além de revolucionar o tratamento de imunodeficiências primárias, o sucesso do estudo abre caminho para novas aplicações em outras doenças genéticas, baseadas em vetores lentivirais e células autólogas.
🔬 No INTERGEN, acompanhamos de perto avanços como este, que reforçam o papel da pesquisa colaborativa e inspiram novas estratégias para desenvolver e adaptar terapias gênicas no Brasil, fortalecendo a ciência nacional e a formação de redes em terapia gênica e celular.
📖 Referência:UCLA Health – Gene therapy delivers lasting immune protection to children with rare disorderBooth, C. et al. Long-Term Safety and Efficacy of Gene Therapy for Adenosine Deaminase Deficiency. New England Journal of Medicine, 2025.




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