Atualização de Segurança : Roche e Sarepta pausam ensaio clínico ENVISION com Elevidys após eventos fatais relacionados à toxicidade hepática
- intergendivulgacao
- 17 de jun.
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Atualizado: 24 de jun.
Nas últimas semanas, a comunidade científica foi abalada por uma notícia preocupante: o ensaio clínico ENVISION, que testava a terapia gênica Elevidys (delandistrogene moxeparvovec-rokl) em pacientes com Distrofia Muscular de Duchenne (DMD) em estágio mais avançado, foi suspenso temporariamente após a morte de dois participantes.
Afinal, o que é o Elevidys?
Trata-se de uma terapia gênica aprovada em 2023 pelo FDA para crianças de 4 a 5 anos que ainda conseguem andar. A DMD é uma doença genética rara e progressiva, causada por mutações no gene da distrofina, proteína essencial para manter a integridade das fibras musculares.
O Elevidys funciona entregando uma versão funcional e reduzida desse gene, chamada microdistrofina, utilizando um vetor viral do tipo AAV (adeno-associated virus). O objetivo é levar esse gene até as células musculares do paciente — como se fosse um “carro” entregando uma peça que faltava — para tentar retardar a progressão da doença.
O que o estudo ENVISION estava testando?
Originalmente, o Elevidys foi aprovado apenas para crianças pequenas que ainda conseguem andar. O ENVISION buscava expandir essa indicação para pacientes não deambulantes, ou seja, que já perderam a capacidade de andar, avaliando se a terapia seria segura e eficaz também nessa fase mais avançada da DMD.
O que aconteceu?
Infelizmente, dois pacientes que participaram do ENVISION faleceram após desenvolverem insuficiência hepática aguda. A primeira morte foi registrada em março de 2025, e a segunda agora, em junho.
Esses pacientes receberam doses mais altas do vetor viral, já que a terapia é administrada de acordo com o peso do indivíduo. Isso significa que quanto mais velho (e pesado) o paciente, maior a dose — e, consequentemente, maior a carga viral. A toxicidade hepática é um risco conhecido nesse tipo de terapia, especialmente quando se usam altas doses de AAV, pois o sistema imunológico pode reagir com força, levando a processos inflamatórios graves e até falência de órgãos.
Como as empresas e autoridades reagiram?
Diante desses eventos, a Sarepta Therapeutics (desenvolvedora do Elevidys) e sua parceira global, a Roche, suspenderam temporariamente o uso da terapia em pacientes não deambulantes. A Sarepta agora está em diálogo com a FDA para propor estratégias de mitigação de risco, como o uso de imunossupressores para reduzir reações adversas. Fora dos Estados Unidos, a Roche também pausou o uso comercial do tratamento nessa população e interrompeu o recrutamento de novos participantes nos ensaios clínicos.
As agências regulatórias agiram rapidamente e determinaram a suspensão do estudo ENVISION até que novas medidas de segurança sejam avaliadas e implementadas.
E para as crianças entre 4 e 5 anos?
Essa notícia não afeta a indicação já aprovada para crianças pequenas. Nenhum caso de óbito foi registrado nessa faixa etária, e os dados clínicos continuam mostrando bons resultados de eficácia e segurança. Ou seja, os riscos identificados até agora se concentram em populações mais velhas, que recebem doses maiores da terapia.
Uma reflexão necessária:
A Dra. Hilda Petrs Silva, do Laboratório de Terapia Gênica e Vetores Virais da UFRJ, compartilhou uma análise sensível e profunda sobre o impacto desses eventos, destacando a importância da prudência no avanço dessas tecnologias:
“As trágicas mortes de dois meninos causaram comoção nas comunidades de terapia gênica e DMD em todo o mundo. Embora estejamos diante de uma ferramenta revolucionária, precisamos de cautela ao expandir seu uso para populações mais vulneráveis.
Estamos falando de terapias altamente promissoras, com potencial de transformar completamente o curso de doenças genéticas graves - mas também de tratamentos complexos, que envolvem doses elevadas de vetores virais, respostas inflamatórias imprevisíveis e pacientes muitas vezes com histórico clínico delicado.
A segurança precisa caminhar junto com a inovação. Por isso, a suspensão temporária do estudo ENVISION é uma medida responsável, que deve ser acompanhada de um esforço redobrado para entender os fatores de risco, refinar os protocolos clínicos e proteger os pacientes mais suscetíveis.
Ainda acreditamos no futuro da terapia gênica. Mas é fundamental lembrar que cada vida importa - e que o avanço só é real quando coloca a segurança dos pacientes em primeiro lugar.”
Seguimos acreditando no potencial transformador da terapia gênica, mas também reconhecendo que ela exige transparência, rigor científico e responsabilidade em cada passo. O progresso só é verdadeiro quando anda lado a lado com a segurança dos pacientes.
📎 Referência da notícia:
Para saber mais detalhes sobre a suspensão do estudo ENVISION e o posicionamento oficial da Sarepta Therapeutics, acesse a matéria original publicada pelo portal Fierce Pharma:

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