Como Nascem os Tratamentos de Terapia Gênica? Entenda o Processo
- intergendivulgacao
- 7 de abr.
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A terapia gênica representa uma revolução na medicina, oferecendo a possibilidade de tratar doenças genéticas raras, cânceres e outras condições complexas na raiz do problema: o DNA. Mas como um tratamento tão inovador sai do laboratório e chega até os pacientes?
O desenvolvimento de uma terapia gênica é um processo longo e altamente regulado, que envolve desde a identificação de um alvo genético até a produção do medicamento final aprovado para uso clínico. Isso exige pesquisas avançadas, testes rigorosos e a colaboração entre cientistas, médicos e agências reguladoras.
Neste artigo, vamos explorar cada etapa dessa jornada: desde a idealização da terapia, passando pelos ensaios pré-clínicos e clínicos, até a produção e distribuição do tratamento aos pacientes. Assim, o processo será apresentado em cinco importantes etapas: descoberta, estudos pré-clínicos, regulação de ensaios clínicos, ensaios clínicos e aprovação regulamentar.
Pesquisa e descoberta do gene candidato
O processo tem início quando os pesquisadores identificam o(s) gene(s) responsável(is) por uma determinada condição fenotípica. Essa informação pode ser obtida por meio da caracterização clínica da doença, associada a técnicas como mapeamento genético ou sequenciamento do DNA. A análise bioinformática desempenha um papel fundamental nesse estágio, auxiliando na triagem e priorização de variantes genéticas. Após a identificação de uma variante candidata, é essencial validar os achados utilizando modelos celulares, modelos animais ou outras abordagens experimentais.
Com a identificação do(s) gene(s) responsável(is) pela condição patológica e sua função no organismo, é essencial avaliar fatores como a natureza da mutação, o grau de expressão gênica, o tecido afetado e se a doença é monogênica ou poligênica. Com base nessas informações, define-se a estratégia terapêutica mais adequada, que pode envolver adição gênica, edição genética, silenciamento gênico ou modulação epigenética. Por fim, determina-se o vetor ideal para a entrega do material genético, que pode ser viral ou não viral.
Estudos Pré-clínicos
Os estudos pré-clínicos são uma fase essencial no desenvolvimento de terapias gênicas, com o objetivo principal de determinar a segurança e a eficácia do tratamento antes de sua aplicação em humanos. Além disso, essa fase é crucial para fornecer evidências sobre os efeitos bioquímicos do produto terapêutico. Normalmente, os estudos pré-clínicos são realizados utilizando modelos animais (in vivo), modelos celulares (in vitro) ou, em alguns casos, modelos computacionais (in silico). O propósito dessa etapa é entender a resposta terapêutica ao tratamento, abordando aspectos farmacológicos e toxicológicos, e fornecer informações sobre a dose, frequência e a rota de administração ideais do produto terapêutico. Com esses dados, os pesquisadores estabelecem a base para os ensaios clínicos subsequentes.
Em um típico estudo pré-clínico de terapia gênica, são avaliadas várias dimensões, incluindo a farmacocinética, que se concentra no entendimento da absorção, distribuição, metabolismo e eliminação do agente terapêutico. O objetivo aqui é garantir a segurança, avaliar potenciais efeitos tóxicos do produto e identificar respostas imunológicas possíveis. Além disso, é fundamental verificar se o vetor utilizado é capaz de atingir adequadamente o tecido-alvo. Outro aspecto importante é a farmacodinâmica, que analisa a relação entre a concentração do produto no organismo e seu efeito biológico. Isso envolve a avaliação do efeito terapêutico (benefício), a segurança e os efeitos adversos que podem ocorrer. Por fim, a toxicologia é uma área crítica, com estudos focados em identificar possíveis toxicidades associadas ao produto terapêutico, garantindo que os riscos sejam minimizados antes de avançar para os ensaios clínicos.
Dessa forma, é através dos estudos pré-clínicos que será possível avaliar a eficácia da terapia gênica e verificar se houve a correção do defeito genético e uma possível melhora na patologia observada. Se os resultados forem promissores, os pesquisadores podem solicitar aprovação para iniciar estudos clínicos em humanos.
Avaliação Regulatória para Ensaios Clínicos
Ensaios clínicos precisam da aprovação e supervisão de órgãos reguladores e comitês de ética para assegurar que tanto a condução do estudo quanto seus aspectos técnicos atendam aos padrões estabelecidos. No Brasil, os estudos são avaliados pelos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP), pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Ensaios Clínicos em Humanos
Após a conclusão bem-sucedida dos estudos pré-clínicos, as terapias gênicas avançam para os ensaios clínicos em humanos, processo designado para determinar a segurança e a eficácia da terapia. Esses ensaios são conduzidos em cinco fases distintas, cada uma com objetivos específicos, baseada nas condições específicas e requisições da terapêutica. Cada fase dos ensaios clínicos desempenha um papel fundamental para garantir que a terapia gênica seja segura e eficaz antes de ser aprovada para uso generalizado.
Fase 0 - Nesta fase, é utilizada uma microdose do produto terapêutico, com o objetivo de avaliar a farmacocinética e a farmacodinâmica da terapia em um número pequeno de voluntários ou pacientes.
Fase 1 - Considerada a primeira etapa da testagem em humanos, utiliza-se um pequeno grupo de voluntários portadores da doença. O principal objetivo é avaliar a segurança, tolerância, às propriedades farmacodinâmicas e farmacocinéticas da terapia. Diversas dosagens são testadas para determinar a segurança e a dose ótima. Essa fase é realizada em condições ambulatoriais.
Fase 2 - Nesta fase, um grupo maior de indivíduos é utilizado para avaliar como a terapêutica funciona dentro do organismo. Além disso, a avaliação de segurança continua. O objetivo principal é determinar a dose mais adequada e sua eficácia.
Fase 3 - Aqui, ocorrem os ensaios clínicos randomizados, com a seleção de um grande grupo de pacientes de forma aleatória. O principal objetivo é avaliar a efetividade do tratamento em comparação com um tratamento padrão ouro
Fase 4 - A última fase, que ocorre após a confirmação da eficácia e segurança do tratamento, tem como objetivo realizar a vigilância da segurança da terapêutica em longo prazo. Nessa fase, são identificados efeitos adversos raros ou que possam surgir ao longo do tempo.
Aprovação Regulatória
A aprovação regulatória de terapias gênicas é um processo rigoroso conduzido por agências de saúde como o FDA (Estados Unidos), a EMA (Europa) ou a ANVISA (Brasil), com o objetivo de garantir que o produto seja seguro e eficaz para uso humano. O processo começa com a submissão do pedido de autorização após a realização de estudos pré-clínicos e clínicos que demonstram a segurança, eficácia e qualidade do produto. Importante notar que a complexidade do processo também se deve aos desafios únicos da terapia gênica, como o uso de vetores virais e o potencial de efeitos de longo prazo, exigindo um monitoramento contínuo e a coleta de dados pós-marketing. Portanto, a aprovação regulatória é crucial para garantir que formas de tratamento como a terapia gênica, com alto potencial terapêutico, sejam eficazes, seguras e, sobretudo, benéficas para os pacientes.
Referências
GOUY, C. M. L.; PORTO, T. F.; PENIDO, C. Avaliação de ensaios clínicos no Brasil: histórico e atualidades. Revista Bioética, v. 26, n. 3, p. 350–359, dez. 2018.
HONEK, J. Preclinical research in drug development. Medical Writing, [s. l.], v. 26, n. 4, p. 5–8, 2017. Disponível em: https://research.ebsco.com/linkprocessor/plink?id=ee6b4c03-350c-304c-8a1b-87c542b0face. Acesso em: 22 mar. 2025.
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